Desde o novo incêndio ao Teatro Valdemar de Oliveira até os debates sobre a valorização dos cinemas de rua, os temas foram destaque em 2024
2024 foi um ano intenso para os setores de Cinema e Teatro em Pernambuco. E a Manguetown Revista lançou um olhar especial para diversas manifestações culturais dentro desses segmentos. Nestes doze meses, os grupos Magiluth e O Poste Soluções Luminosas celebraram 20 anos de trabalhos; os festivais, realizados em locais fechados ou ocupando as calçadas e praças, rechearam o calendário cultural; peças, espetáculos de dança e produções audiovisuais mostraram que o Estado mantém-se potente quando o assunto é Cultura.
Em nossa curadoria, dois assuntos não saíram das nossas redes e páginas de site: a importância de preservar os equipamentos culturais e a democratização do acesso à cultura.
Nas coxias, foi o Teatro Valdemar de Oliveira, localizado no centro do Recife, que chamou atenção para o tema. Em 2023, a Manguetown Revista já evidenciava o descaso com o estado do equipamento.
O Teatro Valdemar de Oliveira é um dos espaços culturais que mais clamam por esforços de preservação. O local carrega uma história marcada por lutas desde sua inauguração. Originalmente chamado de "Nosso Teatro", foi fundado em 1971 pelo escritor e teatrólogo que lhe dá o nome para ser a casa do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP), grupo criado em 1941. Em 19 de outubro de 1980, o teatro sofreu um grave incêndio que destruiu suas instalações. A recuperação foi longa, foi reinaugurado em 1987, quando a casa de espetáculos foi devolvida à sociedade pernambucana como um símbolo de resistência e arte.
Em 2020, o equipamento foi mais uma vez fechado, desta vez devido à pandemia de Covid-19. Durante esse período, o local foi invadido, depredado e roubado, com inúmeros itens saqueados, incluindo portões de ferro, telhas e equipamentos técnicos. Com o teto desabado e sem condições de uso, o histórico piano de cauda foi transferido para o Conservatório Pernambucano de Música, preservando ao menos parte do legado do espaço.
Este ano, no dia 7 de fevereiro, o teatro vivenciou um novo incêndio, destruindo as cadeiras remanescentes e entulhos no local. O Teatro Valdemar de Oliveira já se encontrava em estado de abandono, chegando a ser abrigo para pessoas em situação de rua, segundo relatos. Apesar do perigo iminente de desabamento, não houve vítimas no incidente. Esse episódio intensificou a mobilização pela preservação do espaço.
O incêndio comoveu a classe artística pernambucana, que antes mesmo deste terrível ocorrido já lutava pelo espaço e sua preservação. O futuro do teatro, porém, permanece incerto. Do auge ao apagamento, a história desse equipamento reivindica atenção aos nossos espaços de cultura para que sigam como incentivadores da produção e da apreciação da arte pernambucana.
Já no making of, os cinemas de rua, de calçada, da tela que transita do litoral ao sertão tomaram para si as discussões o ano inteiro. No centro do debate, o Cinema São Luiz, na região central da capital pernambucana, desencadeou uma série de eventos e estudos que clamavam a valorização de espaços como este.
Após dois anos fechado, o Cinema São Luiz voltou a receber o público em 1º de dezembro, sediando a 15ª edição do Festival Janela Internacional de Cinema. Ainda em obras, o espaço vem funcionando em esquema especial, apenas nos fins de semana. Enquanto isso, no Sertão do Estado, a 3ª Mostra da Diversidade Sexual no Sertão do Pajeú e o Festival de Cinema de Triunfo promoveram uma verdadeira injeção de estima nos Cinema São José, em Afogados da Ingazeira, e o Theatro Cinema Guarany, em Triunfo, respectivamente. Os eventos trouxeram na programação, conversas sobre os equipamentos e visitas guiadas sobre cinema de rua. Em Belo Jardim, no Agreste, o Cine Jardim, e em Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata, o FestCineVSA somaram-se ao movimento.
A Manguetown Revista pautou o debate com uma série de reportagens especiais sobre o processo de reabertura do imponente cinema recifense e os impactos dos cinemas de rua no incentivo à produção audiovisual independente.
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Outras iniciativas se juntaram às discussões sobre o fortalecimento de espaços de exibição de filmes fora de estabelecimentos comerciais. O Bar Super-8, situado na famosa Rua Mamede Simões, no centro do Recife, colocou na rua, ou melhor na calçada, o projeto Encontros de Cinema Pernambucano, por meio do qual foram realizadas mais de 100 sessões, seguidas de conversas descontraídas.
O Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto de Pernambuco (MTST-PE), por sua vez, lançou uma campanha para viabilizar o Cinema Sem-Teto. A proposta prevê exibições itinerantes em ocupações e lugares com pouco ou nenhum acesso a salas de cinema.
Os festivais com lugar marcado no calendário pernambucano não ficaram de fora do coro. O Mov - Festival de Cinema Universitário transformou estações de metrô em sessão de cinema. O Animage - Festival Internacional de Animação de Pernambuco e outras mostras de filmes ocuparam parques e praças com exibições gratuitas.
2024 mostrou que a cultura em Pernambuco é sinônimo de resistência, reinvenção e mobilização. Seja no esforço por manter vivas as memórias do Teatro Valdemar de Oliveira e do Cinema São Luiz, seja na celebração de festivais que transformam espaços públicos em verdadeiras arenas de arte, o ano foi marcado pelo protagonismo de artistas e coletivos culturais. A história desses equipamentos e eventos reforça que a preservação e a democratização do acesso à cultura não são apenas metas a serem perseguidas, mas necessidades urgentes para que a arte continue pulsando em cada esquina do Estado. A Manguetown Revista encerra esse ciclo na expectativa de as conquistas deste ano inspirem os desafios que ainda estão por vir.
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